1. INTRODUÇÃO

O sul do Brasil, principalmente os estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul, entre os anos de 1980 a 2008, por quase 30 anos, figurou como um amplo cenário de conflitos e de lutas pela reforma agrária. Em quase todos os anos desse período, ocupações, restituições de posse, confrontos entre acampados com as forças de ordem social (Polícia Militar) e com milícias contratadas por latifundiários, manifestações públicas buscando legitimar suas ações, tanto de agricultores sem terra, quanto grandes proprietários solidários com o que estava sendo alvo de desapropriação se fizeram presentes e marcaram, em particular, a região Norte do estado do Rio Grande do Sul.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), constituído nos primeiros anos da década de 1980, foi, em grande parte, o agente desse processo de luta social e que deu ênfase ao que se denominou “questão agrária” no Brasil (Medeiros, 1989) envolvendo ações em prol da reforma agrária e da mudança na estruturação fundiária do país. Essa instituição de representação de pequenos agricultores, em suas duas primeiras décadas, esteve mediada, assessorada e integrada por órgãos de igrejas, em particular, a Católica, através da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e de lideranças religiosas não inseridas em organizações institucionais de representação. Posteriormente, no final da década de 1990, houve uma maior participação de agremiações políticas no interior do referido movimento social como resultado de uma nova conjuntura da sociedade política brasileira e de uma redefinição das pastorais da Igreja Católica.

No sul do Brasil, houve dezenas de assentamentos como consequência da luta social empreendida pelo MST, principalmente entre as décadas de 1980 e 1990. A partir do século xxi, esse processo na referida região recrudesceu bastante. A partir do início do século xxi houve alteração na legislação para efeito de reforma agrária, principalmente no que tange à desapropriação, ou seja, tornou-se muito fácil ao proprietário-alvo da desapropriação pelo MST justificar que o imóvel era produtivo, pois as normativas aprovadas pelo Congresso brasileiro no final de 2002, no final do governo de Fernando Henrique Cardoso, tornavam mais difíceis as desapropriações para reforma agrária; houve uma intensa pressão de representantes políticos em favor do agronegócio justificando que a reforma agrária não seria mais necessária no país, pois a produção de alimentos demonstrava sua pujança; houve uma profunda reorganização política e estratégica do MST, principalmente com a redução do papel da Igreja Católica em seu interior, bem como a busca de parcerias com o movimento operário, com as pastorais de periferia das grandes cidades para ampliar o contingente de demandantes pela terra e pela reforma agrária, maior inserção de agremiações políticas institucionais no interior do referido movimento, a necessidade de consolidar assentamentos já definidos, a multidimensionalidade das lutas sociais no país na forma de rede e com a participação do MST, a organização política, repressiva e jurídica das representações do grande capital fundiário no país, principalmente o poder judiciário em alguns estados, dentre outros aspectos, foram fundamentais para que houvesse uma realidade menos intensa de ações em prol da reforma agrária com desapropriação de latifúndios.

Nas duas décadas que indicamos houve acampamentos e, posterior, assentamentos que marcaram a história da luta pela terra no sul do Brasil dentre eles, o Acampamento Encruzilhada Natalino (1981-1984) e da Fazenda Annoni (1985-1993) no norte do estado do Rio Grande do Sul (CPT, 2007; Foschiera, 2008).

A primeira década e meia do século xxi, com a presença, em boa parte, dos presidentes Luís Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff no cenário político do Brasil, imaginava-se a viabilização efetiva da reestruturação agrária do país com a efetivação da reforma agrária pretendida e idealizada pelo MST. Os movimentos sociais ampliaram-se em nível de país, estruturam-se na forma de redes, ampliaram demandas conjuntas, inclusive com organizações internacionais, como o caso da Via Campesina1, ou seja, houve uma visibilidade maior de sujeitos coletivos do campo democrático e popular, novos grupos sociais reivindicando cidadania e direitos (Gohn, 2006), porém, a questão agrária não foi alterada como se imaginava e as desapropriações de latifúndios foram exíguas (Schu, 2009).

Cabe destacar que a questão agrária não foi resolvida. Longe de termos os conflitos agrários como expressões do passado, percebe-se a continuidade na atualidade da luta social por terra, fato esse que coloca o país frente ao dilema de repensar o modelo de desenvolvimento alicerçado no agronegócio, visando resolver os conflitos no campo, ou aprofundá-los com a continuidade da grande propriedade capitalista moderna.

O presente trabalho analisa a disputa protagonizada pelos MST na Fazenda Coqueiros como “episódio” do processo de resistência dos atores sociais no campo ao latifúndio e à modernização conservadora do campo brasileiro, esta viabilizada, em grande parte pelo regime militar. Se, em primeiro momento, os empresários rurais se sentiram ameaçados pelo golpe, em razão da aprovação do Estatuto da Terra (1964), logo depois, grande parte de suas demandas no período anterior virou o sentido das novas políticas públicas. Assim, por meio de incentivos fiscais para projetos agropecuários e crédito farto e barato, promoveu-se a modernização tecnológica nas áreas de cultivos tradicionais e foi estimulada a ocupação das fronteiras pelos grandes capitais, expulsando posseiros (Medeiros, 1989: 124).

A análise possui como elemento problematizador as ações de judicialização e criminalização que a presente luta social produziu, ou seja, por que neste contexto político específico, de certa correspondência com as demandas sociais, a desapropriação da Fazenda Coqueiros poderia representar perigo para a estrutura agrária brasileira? Por que ela produziu um grande envolvimento político e do campo jurídico do estado do Rio Grande do Sul no período de sua vigência?

Na década de 2010, novas correlações de forças se processaram, batalhas jurídicas e políticas fizeram com que a legislação agrária fosse mais fechada para a possibilidade de reforma agrária, principalmente no final do governo Fernando Henrique Cardoso (2002), no que se refere à desapropriação de terras para esse fim. Em outras palavras, a grande propriedade da terra ficou mais protegida. Porém, a luta pela reforma agrária não recrudesceu, ganhou, sim, novos ares em uma dimensão não tanto econômica, mas social, ou seja, uma dívida histórica da esfera política para com o campesinato brasileiro, passando a ser vista como sinônimo de justiça social, de promoção de ações produtivas no campo do equilíbrio agroecológico e de sustentabilidade ambiental por meio de experiências de cultivos em assentamentos sem agrotóxicos, de produtos orgânicos etc. As instituições de mediação dos movimentos de luta pela terra/reforma agrária já não eram mais as mesmas, o próprio MST percebeu a necessidade de redefinição de sua performance social de mediação, vinculado a partidos políticos e participando da vida política institucional do país, dentre outras questões. Enfim, os primeiros anos do século xxi, em termos de movimentos sociais e, em particular, de luta pela terra em geral, revelam amplas mudanças em correspondência com as alterações sociais e políticas da sociedade brasileira.

É nesse contexto que se localiza o movimento social de luta pela terra no interior da Fazenda Coqueiros, objeto de nosso estudo. Essa luta social cristaliza e expressa, regionalmente, esse processo todo, por isso representa um divisor e fronteira entre dois períodos redefinidos na história agrária no sul do país, em particular, no estado do Rio Grande do Sul, porém, mantém lógicas que são de continuidade no sentido da reforma agrária e do MST como agente institucional do coletivo camponês.

O conflito denominado pelo MST e pelo poder judiciário e político a ele direcionado, de Fazenda Coqueiros começou em 2004. A referida fazenda pertencia, neste ano, à família Guerra (pais e filhos); possuía uma extensão de aproximadamente sete mil hectares, e atingia mais de 30% (CPT, 2007) do território agrícola do município de Coqueiros do Sul2.

As investidas do MST no interior e na circunvizinhança da Fazenda Coqueiros começaram em abril de 2004 por ocasião do ato do MST em nível de país, conhecido como Abril Vermelho3, período de maior intensidade de ações em prol da reforma agrária pela entidade mediadora e que produziu inúmeras contraposições, publicizações sociais e matérias jornalísticas. As estratégias do MST foram no sentido de constituir acampamentos mais distantes da fazenda, em beira de rodovia (BR 386) para facilitar o acesso, a visibilidade pública ao ocupar um espaço pertencente à esfera pública, ou seja, a faixa lateral de domínio. Outros acampamentos, considerados provisórios foram efetivados próximos ou dentro da área da referida fazenda com a intenção de produzir um fato social, visibilidade pública e midiática, bem como envolver os membros do MST como ritual de ação e fortalecimento da demanda e da luta social. Em razão dessas estratégias do MST e de constantes reintegrações de posse concedidas pela Justiça na Comarca de Carazinho, município próximo a Coqueiros do Sul, em 2004, essa experiência do MST ganhou visibilidade em nível nacional.

Tendo presente esse cenário, essa temporalidade e essa específica luta social empreendida pelo MST no sul do Brasil e que teve múltiplas repercussões pela sua dimensão jurídica, política, de performance do referido movimento e da referida fazenda (altamente produtiva)4 e do resultado obtido é que justificamos nossa reflexão e análise ainda que sintética.

O artigo5 intenciona sistematizar algumas ações dessa luta pela terra do MST e analisa a dimensão política, jurídica e de repressão. Revisamos jornais locais de Passo Fundo (centro-norte do estado do Rio Grande do Sul) como o Diário da Manhã e O Nacional, bem como o Zero Hora e Correio do Povo da capital, Porto Alegre, no período entre 2004 a 2009, com a intenção de perceber o envolvimento e o interesse da imprensa jornalística em torno do fato. Analisamos ainda boletins de ocorrência da Brigada Militar (BM), produções de folhetos e panfletos do MST no período, documentos do poder judiciário, dossiês do comando da BM do norte do estado, inquéritos da polícia federal e pesquisas no site do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, dentre outros recursos. Primeiramente analisaremos alguns dos processos estratégicos de ambos os lados para justificar suas demandas, sensibilizar a opinião pública e dar visibilidade ao fato; posteriormente, serão abordadas, ainda que sinteticamente, ações políticas e judiciais que produziram criminalização e intensa judicialização da luta social, principalmente em torno dos processos que justificaram o desmantelamento dos acampamentos e o fim da luta do MST na referida fazenda.

2. ESTRATÉGIAS, CONTRAPOSIÇÕES: UM CENÁRIO DE CONFLITOS E TENSÕES

Como já mencionamos, havia, no início do século xxi, em nível de país, com relação aos movimentos sociais, uma ampla rede formando um campo democrático e popular de demandas sociais (Gohn, 2006). Esse campo também estava interligado em redes com outros grupos em nível de América Latina (Scherer-Warren & Luchmann, 2011). A luta pela terra estava nesse novo horizonte de organização. Desse modo, com aproximadamente 700 integrantes, o MST estruturou um grande acampamento e reivindicou a desapropriação da Fazenda Coqueiros no ano de 2004. Esse processo, já no início, produziu grande impacto e repercussão pelas suas estratégias, quantidade de pessoas e o alvo da propriedade a ser desapropriada. Assim informava um jornal do município de Passo Fundo e de circulação pelo norte do estado:

A primeira e maior movimentação ocorreu no início do mês, quando cerca de 700 famílias ocuparam uma área da Fazenda Coqueiros, de propriedade da família Guerra, em Coqueiros do Sul. Desde terça-feira [13 de abril], outro grupo de aproximadamente 500 pessoas, integrantes do acampamento marcham em direção a Coqueiros do Sul e começaram a montar acampamento a 4 km de distância da Fazenda Coqueiros (Cornélio, 2004).

Faziam parte da constituição dos acampamentos da Fazenda Coqueiros, pequenos agricultores (proprietários), meeiros, trabalhadores rurais de uma forma geral que trabalhavam no interior de latifúndios e em madeireiras da parte norte do estado, assim como novos membros provenientes de periferias urbanas de municípios dessa região e que possuíam algum histórico com a terra em tempos anteriores e que foram vítimas do êxodo rural.

Em termos de estratégias e correlações de força, se o MST havia produzido um know how, porém, os grandes proprietários de terra, nas suas representações, também se precaveram; estenderam suas resistências e estratégias junto ao campo político, jurídico e social, tendo em vista que no início do governo Lula havia toda uma expectativa na sociedade (para ambos os grupos sociais envolvidos) que esse processo de luta pela terra e reforma agrária ganharia corpo e dinamismo maior. A União Democrática Ruralista (UDR), órgão de defesa dos grandes proprietários de terra no Brasil, constituiu-se no Norte do estado e atuou por todo o período em que o movimento social permaneceu na região (Schu, 2009; STR, 2005). Nesse sentido, logo em seguida à efetivação do acampamento e suas tentativas de ocupação da Fazenda, recomeçaram as convencionadas “batalhas judiciais” em defesa da propriedade e/ou pela sua desapropriação. Um dos primeiros atos dos representantes dos proprietários foi uma audiência na Comarca de Carazinho, onde ficou determinado o prazo de trinta dias para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) resolver a situação.

É pertinente situar historicamente o conflito da Fazenda Coqueiros. A região onde se localiza a propriedade é uma área conflagrada por diversas contendas agrárias e sociais, em especial a partir da década de 1960. Essa região foi palco, por exemplo, dos conflitos do Acampamento Encruzilhada Natalino (1981-1984) e Annoni (1985-1993), que contribuíram significativamente para a formação dos MST6.

O ano de 2004 foi, de um lado, expressivo na consolidação das intenções dos sem-terra; estratégias de greves de fome dos sem-terra, carreatas, caminhadas pela região e manifestações públicas foram expedientes constantes do MST em cidades do norte do estado (Schu, 2009); de outro lado, houve uma ampla recomposição das forças dos grandes proprietários na região em termos de organização, estratégias de defesa, exposição e ocupação de espaços públicos (mídias locais, regionais, rodovias, praças, ruas centrais de cidades). Necessitava-se, por parte de ambos os lados, produzir fatos de visibilidade e repercussão social sobre o tema (Schu, 2009). Jornais da capital do estado e da região divulgavam matérias semanalmente sobre a questão em espaços de destaque, alertando e prevendo possíveis confrontos com resultados desastrosos para as partes. Houve ações que promoveram paralisações de rodovias, várias moções de apoio a ambos os envolvidos, ações na justiça, relatos da Brigada Militar –em geral com tom de desqualificar o movimento–, tachando os seus membros e/ou a entidade (MST) como terroristas, presentes inclusive em outros países (FARC, na Colômbia), várias marchas de sem-terra por cidades da referida região do conflito, bem como uma grande caminhada a Porto Alegre, engrossamento de acampamentos para somar forças e pressionar o governo federal pela desapropriação e tantas outras situações marcaram os dois primeiros anos de conflitos (2004 a 2006).

Já que a legislação agrária brasileira não permitia a desapropriação de áreas consideradas produtivas pelo Incra, o objetivo do MST passou a ser a desapropriação da área por não cumprir o que se considerava no período como função social da terra, ou seja, a instituição de mediação argumentava que a Fazenda Coqueiros não cumpria com o que a Constituição Federal de 1988 determinava no caput do art. 5º, XXII e XXIII, ou seja:

Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, á igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes:

[...]

O Código Civil condiciona ao cumprimento da função social da propriedade com o Art. 186 da Constituição Federal, regulamentado pela Lei 8.629/1993, definindo da seguinte forma:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I – aproveitamento racional e adequado;

II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

O Quadro a seguir, elaborado pelo MST, mostra as possíveis alterações no processo econômico e o desenvolvimento regional caso a Fazenda Coqueiros fosse desapropriada e viabilizada a reforma agrária, fundamentada na função social que deveria cumprir. Esse quadro também fundamentava a solicitação do MST junto ao Incra e ao Ministério de Desenvolvimento Agrário (MDA) para fundamentar a sua desapropriação.

QUADRO 1

Justificativas do MST para a desapropriação por função social da terra da Fazenda Coqueiros, 2005

VariáveisFazenda Coqueiros em 2005Fazenda Coqueiros quando fosse assentamento do MST
Número de famílias2 famílias dos capatazes.300 famílias assentadas morando numa área lote de 15 hectares cada uma.
Emprego2 capatazes fixos e no máximo 20 empregos temporários-safras. 1.400 empregos diretos na agricultura sem contar empregos de professora, técnicos...
EscolaNenhuma escola na fazenda.Escolas e creches para atender mais de 400 crianças.
ProduçãoMilho, soja e gado de corte para exportação.Grande variedade de produtos, como grãos, leite, verduras, pequenos animais para serem vendidos no comércio local.

Fonte: documento da Comissão Pró-desapropriação da Fazenda Coqueiros; assinada por prefeitos e entidades regionais. Material distribuído pelo MST em Carazinho.

Para fazer frente aos argumentos dos sem-terra de que a referida fazenda não cumpria sua função social e não gerava emprego e renda na região, foram realizados estudos pelo seu proprietário para mostrar que a mesma cumpria todos os requisitos de produtividade, de volume de produção e de equilíbrio ambiental, e que gerava renda direta e/ou indiretamente na região, além da documentação de aquisição da propriedade de longa data, os processos de passagem de uma geração a outra, investimentos produtivos e de sustentabilidade ambiental (reflorestamento, retenção de água, geração de energia com usina própria etc.). Todas essas situações foram amplamente divulgadas pela mídia regional e estadual em matérias pagas.

A partir de 2006, uma estratégia do MST em nível de país teve início na luta social junto à Fazenda Coqueiros, ou seja, agrupar contingentes de outros acampamentos no estado ou, também no estado vizinho de Santa Catarina com a intenção de efetivar pressão em torno da sua demanda. Esse processo colocava em alerta as forças de contraposição e as de controle social. Vários enfrentamentos constituíram-se nesse sentido. Isso mobilizava grande quantidade de pessoas, intensa força policial, cobertura jornalística, temor de conflitos e enfrentamentos bélicos e o uso do expediente da violência física por ambos os lados (membros do MST e milícias dos grandes proprietários, bem como das forças policiais). O campo jurídico foi acionado inúmeras vezes para viabilizar as reintegrações de posses (um total de 12 em 5 anos).

No início de 2007, os acampamentos situados ao redor da Fazenda Coqueiros somavam mais de 800 pessoas adultas. Isso fez com que a política militar, temendo enfrentamentos, permanecesse no local com um contingente quase que diariamente. Isso provocou reprovação social na região em razão da ausência do efetivo militar na segurança pública nas cidades, em particular, a de Passo Fundo, além do intenso desembolso financeiro para manter o destacamento policial no interior da fazenda demandada pela desapropriação. Porém, segundo lideranças do MST, as ações do governo do estado eram mais de proteção à propriedade privada do que temor de confronto social. Isso provocou uma ampla judicialização pelos três sujeitos envolvidos (governo, proprietário e MST).

Como já mencionamos, uma das características desse novo acampamento foi a reduzida presença mediadora de igrejas, em particular, a Católica, tendo em vista que na região havia se constituído, por mais de vinte anos, um quadro de lideranças no interior do catolicismo sempre inserido nos movimentos anteriores, inclusive com forte presença nos quadros oficiais da Comissão Pastoral da Terra (CPT). A Igreja Católica, por meio das pastorais sociais, como a CPT, apoiava a demanda dos sem-terra, porém, nesse período, já não era mais uma entidade orgânica no interior do movimento (Foschiera, 2008; Morissawa, 2001). A conjuntura política colaborou com: a presença de partidos políticos no interior do MST no apoio à causa; a representação e a simbologia da mística da cruz, em grande parte, foi substituída pelas cores das bandeiras partidárias e da dimensão racionalizadora (menos de fundamentação religiosa e bíblica em particular) da luta social; as metodologias de ocupações utilizadas, a dinâmica das redes de movimentos sociais, a preocupação da instituição religiosa com os empobrecidos da periferia urbana e o avanço de movimentos neopentecostais, dentre outros aspectos. A ausência de representações oficializadas pela Igreja Católica abriu espaços para outras agremiações, bem como as forças de oposição à reforma agrária ganharam maior legitimidade, dentre as quais as de repressão e de governança política no período (Germano Rigotto [2003-final de 2006] e, posteriormente, Yeda Crusius [2007-final de 2010]). Havia uma clara deliberação em não permitir avanços na reforma agrária no estado e muito menos na região e, pior ainda, se ela fosse efetivada sob o manto da função social da propriedade. Isso poderia abrir um amplo precedente para várias situações no estado e em nível de Brasil (Vieira, 2011).

O MST pressionava intensamente e adotava várias estratégias para viabilizar a desapropriação da Fazenda Coqueiros; uma delas foi convencimento público e a sensibilização social. No site do Incra encontramos a moção de apoio de prefeitos e entidades do norte do estado que defendiam a desapropriação7. Essa ação impactou muito na região, até porque vários prefeitos eram de partidos com representação junto a entidades de grandes proprietários como sindicatos de empregadores rurais, a Farsul (Federação dos Agricultores do Rio Grande do Sul) e a UDR (União Democrática Ruralista).

QUADRO 2

Lista de prefeitos que apoiaram a desapropriação da Fazenda Coqueiros

– Prefeito de Coqueiros do Sul, Acácio de Souza
– Prefeita de Almirante Tamandaré do Sul, Sandra Seben
– Prefeito de Pontão, Delmar Máximo Zambiasi
– Prefeito de Jaboticaba, Vanderlei Molinari e Silva
– Prefeita de Ernestina, Diná Lima da Silva
– Prefeito de Taquaruçu do Sul, Mauro Olinto Sponchiado
– Prefeito de Nonoai, Nelso dos Santos
– Prefeito de Nova Boa Vista, Mauro Luis Dalcin
– Prefeito de Constantina, Francisco Frizzo
– Prefeito de Novo Xingu, Jaime Anderson Martini
– Prefeito de Pinhal, Sergio Valentim Tres
– Prefeito de Santo Antônio do Palma, Milton Cesar Dalastra
– Prefeito de São Pedro das Missões, Paulo Roberto Brizola
– Prefeito de Três Palmeiras, Luiz Conrado Machado
– Prefeito em exercício de Trindade do Sul, Valdomito Bosa
– Prefeito em exercício de Ronda Alta, José Fontana
– Prefeito de Rondinha, Aldemir Luis Cantoni
– Prefeito de Santo Antônio do Planalto, Elio Gilberto Luis de Freitas
– Prefeito de Lajeado do Bugre, Otaviano Paim Ardenghi
– Prefeito de Tio Hugo, Gilmar Muller
– Prefeito de Rio dos Índios, Valdemar Veloso Batisti
– Prefeito de Planalto, Antonio Carlos Damin
– Prefeito em exercício de Rodeio Bonito, Nelson Luis Dalcortivo
– Presidente do Conselho Regional de Desenvolvimento (Corede) da Região da Produção, Nelson José Grasselli

Fonte: Incra (2010).

Essa estratégia de envolvimento de chefes de executivo regional impactou na mídia jornalística. O argumento de prefeitos que deram entrevistas na imprensa justificando seu apoio era de que havia necessidade de promoção do desenvolvimento econômico mais equilibrado em nível regional e que não podia uma propriedade absorver mais de 30% do território agrícola de um município e gerar apenas um par de empregos. Outros enfatizavam a necessidade de reforma agrária para gerar emprego e renda na agricultura, alimentos para a população urbana a preços mais baratos, etc. A dimensão econômica regional se sobrepôs ao horizonte ideológico e político.

3. OS CAMPOS POLÍTICO E JURÍDICO EM AÇÃO: REPRESSÃO E MEDIDAS DE EXCEÇÃO

Em 2007, houve dezenas de efetivação de montagem de acampamentos no interior da referida fazenda. Nos acampamentos fixos, localizados fora da propriedade, em suas cercanias, havia em abril de 2007, mais de 2 mil pessoas (Incra, 2010). Essa realidade numérica repercutiu imensamente na imprensa de cunho mais tradicional e a favor do latifúndio, principalmente o jornal Zero Hora de Porto Alegre, bem como o fato de haver uma participação em rede de outros em nível de estado que se agruparam para efetivar esse contingente. As forças de repressão foram mobilizadas. O proprietário da fazenda utilizou a mediação da imprensa estadual para dar esclarecimentos sobre a propriedade, sobre a necessidade de controlar a ação do MST para evitar confrontos com grandes proprietários rurais que haviam entrado no interior da referida área, bem como auxiliados pelos capatazes do proprietário que montavam guarda em seu interior. A imprensa regional e a do estado, em especial, o jornal Zero Hora, a partir daí, deram cobertura semanal. Essa região novamente fez parte na mídia na identificação da luta pela questão da terra como foi uma década antes em razão das ações do MST na Fazenda Annoni.

O juiz da Comarca de Carazinho, Orlando Faccini Neto, determinou, por meio de liminar, a saída dos acampados da área em várias ocasiões. Numa delas, os sem-terra, diferentemente de outras vezes, não cumpriram a determinação da justiça e instauraram um conflito que se arrastou por alguns meses entre o poder judiciário regional, em especial o Fórum de Carazinho, e o MST (“Um mês de tensão...”, 2007). No dia 24 de março, o delegado de Carazinho, Danilo Flores, anunciou que indiciaria oitocentos integrantes do MST que estiveram presentes na ocupação da Fazenda Coqueiros por, no mínimo, oito crimes (Graeff Júnior, 2007). A partir de abril de 2007, por vários meses, com raras alterações, e por períodos curtos, em torno de trezentos integrantes do MST, que montaram acampamento próximo da fazenda, eram vigiados pela Brigada Militar (BM). A BM destacou em torno de quarenta homens para “montar guarda”, como afirmou Cerutti, comandante regional. Entre 2004 e 2007, em pouco mais de dois anos, o proprietário registrou mais de trinta ocorrências policiais contra o movimento. Órgãos da sociedade civil contestaram a ação da BM, denunciando, inclusive, abusos por ordem de alguns dos seus representantes junto à Agência de Notícias da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul8.

Entre 2006 e 2008, muitas decisões judiciais aconteceram9. Em junho de 2007, numa quinta ocupação, segundo o relato da BM do estado, mais de oitocentas pessoas teriam participado (Incra, 2010). Segundo o comando da polícia militar, mais de quarenta policiais passaram, a partir daí, a monitorar a área diariamente, alimentando a imagem da criminalização do grupo dos sem-terra, enfatizando também os gastos elevados para a operação, que, no final de 2007, já ultrapassava, segundo o relato do comando da corporação de Passo Fundo, um milhão de reais (aproximadamente 600 mil dólares com a cotação do início de outubro de 2007) (Wagner, 2007). Informações circulavam na imprensa do estado, em particular no jornal Zero Hora, de que esse se tornaria o maior movimento dos sem-terra no Brasil, que a intenção do MST era tornar o norte do estado o centro das atenções das suas ações. Havia informação de que o acampamento iria ampliar-se com a chegada centenas de integrantes de outros acampamentos do estado para engrossar as fileiras pela desapropriação, “devem chegar a 500 nos próximos dias, cerca de 2 mil pessoas. A ideia é juntar o número de famílias que a área do Guerra comporta e pressionar pela desapropriação, que vai ser de qualquer jeito”, afirmou Elaine Rissi, uma das coordenadoras do Acampamento Oziel Alves, montado em área próxima à propriedade (Trezzi, 2007).

Em razão disso, e justificado pelas várias ocupações até então, a família Guerra conseguiu munir-se de um recurso jurídico denominado “interdito proibitório”, que permitia requisitar policiais para expulsar os ocupantes toda vez que isso ocorresse. O normal é que os ocupantes permanecessem alguns dias até que o juiz decretasse a reintegração de posse e a ordem de despejo, algo que, com isso, foi dispensado para o caso da Fazenda Coqueiros. A Brigada Militar, com vários de seus batalhões especiais, com aproximadamente 450 homens, esteve de prontidão na área para evitar desembarques de sem-terra de outras regiões do estado. “Podemos mobilizar o efetivo para a região a qualquer minuto. É provável, em função da movimentação do MST”, aventou o subcomandante da BM, coronel Paulo Roberto Mendes (Trezzi, 2007), que, alguns meses depois, tornou-se comandante-geral da Brigada Militar do estado. Outros canais de divulgação nacional, expondo a ideologia da propriedade privada e da criminalização dos pobres, também expuseram sua versão. A revista Veja produziu matérias sobre o tema, contribuindo para a estigmatização do MST:

A Fazenda Coqueiros foi invadida pela sétima vez em dois anos. Surpreendentemente, desta vez os sem-terra do MST ficaram apenas algumas horas na fazenda, que é produtiva, tem dono (a família Guerra) e não cede passo aos delinqüentes políticos [grifo nosso] [...]. A Brigada e o MST recuaram, porque houve ordem direta de Rigotto ao comandante da Brigada Militar, atendendo pedido direto do Palácio do Planalto (Páginas amarelas, 2007).

A repressão policial fazia-se presente toda a vez que chegava algum ônibus com integrantes do MST. O jornal O Globo, do Rio de Janeiro, também noticiou a forte repressão da polícia10; em outubro de 2007, o processo se repetiu e com um maior contingente de camponeses que se aproximaram da Fazenda Coqueiros, aproximadamente 900 integrantes, porém, a estratégia não durou mais do um dia em razão do grande contingente de policiais (aproximadamente duzentos) e com ordem de despejo “a qualquer custo”11.

Entre 2007 a 2008, os conflitos foram intensos, mobilizando o Ministério Público regional, tanto na esfera estadual, quanto federal. Inúmeras ações jurídicas foram impetradas contra as lideranças do acampamento e os do MST. As polêmicas em torno das medidas da justiça desencadearam grandes discussões nos meios jurídicos, acadêmicos e políticos, fato que se tornou fundamental para as ações jurídicas inéditas no ano seguinte em torno da Lei de Segurança Nacional, elaboração de dossiês por promotores públicos estaduais, por comandantes da BM regional, bem como outras ações e moções de apoio a ambas as forças em ação.

No final de 2007, um grande ato, talvez o maior em expressão pública, em defesa da referida propriedade reuniu milhares de ruralistas no interior da Fazenda Coqueiros (“Ruralistas...”, 2007). As ações foram lideradas pela Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (órgão que congrega grandes proprietários e cooperativas empresariais-agrícolas do estado), houve exposição de fotografias, documentos e discussões sobre as mais de mil ocorrências policiais contra o MST até então, as dezenas de ocupações e estratégias para outras ações. A mídia regional e a de maior expressão no estado cobriram intensamente o evento, dando ênfase à causa dos ruralistas, ao perigo do enfrentamento, às ações consideradas crime ao patrimônio privado cometidas pelos sem-terra. O evento envolveu mais de setenta sindicatos rurais, algumas cooperativas, representantes em nível nacional da União Democrática Ruralista (UDR), inclusive foi uma das formas de “ressuscitar a entidade”, como disse um dos participantes (“Ruralistas...”, 2007). Em torno da repercussão da luta social, comentava o jornal Zero Hora:

O Rio Grande do Sul não vê nada igual há 25 anos, desde quando o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ainda não tinha esse nome. Em forma de tridente, colunas formadas por quase 2 mil sem-terra marcham rumo a uma área de cerca de 20 quilômetros de extensão, em Coqueiros do Sul, que pode se transformar no palco do mais impactante conflito agrário da história gaúcha [grifo nosso] (Bertoncello & Trezzi, 2007).

O referido periódico deu ampla cobertura ao fato buscando também legitimar o ato como proteção a um possível maior confronto.

A estratégia de juntar vários acampamentos distribuídos no estado e promover ações conjuntas com amplo contingente de membros repercutiu em nível nacional. Essa ação poderia ampliar a visibilidade do movimento para que ações práticas por parte das autoridades fossem efetivadas uma vez que, ao promover amplos confrontos e a dificuldade de remoção pelo número elevado de pessoas formado por contingentes de mulheres e crianças presentes, chamaria a atenção de órgãos ligados aos direitos humanos, dentre outros, em nível internacional12. Os locais por onde essas caravanas do MST a caminho da Fazenda Coqueiros passavam permitiam visibilidade pública, encontros com entidades, presenças em coletivos e instituições para esclarecimentos sobre a importância da reforma agrária, etc., ou seja, permitia a politização e a conscientização em torno do fato, além de produzir uma intensa mística de luta social entre seus membros.

Ações judiciais fizeram-se presentes para impedir crianças de participar da caminhada. Movimentos de protestos de ruralistas, pressões destes para que prefeitos dos municípios onde esses grupos passassem não concedessem abrigos e auxílios para os membros do MST, dentre outras ações fizeram-se presentes para impedir a estratégia de agrupamento de membros do MST para evitar que chegassem até a Fazenda Coqueiros. Nesse sentido, o comandante da Brigada Militar de Passo Fundo, coronel Cerutti, organizou um relatório sobre a Fazenda Coqueiros e as ações do MST. O relatório é de setembro de 2007, n.º 1124-100-PM2-2007. Num de seus fragmentos, narra:

[...] os setores de inteligência obtiveram informações da estratégia de atuação do movimento na região, que seria incentivada pelas FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), copiando o modelo adotado em tal país [...]. Análises de nosso sistema de inteligência permitem supor que o MST esteja em plena fase executiva de um arrojado plano estratégico, formulado a partir de tal ‘convenio’, que inclui o domínio de um território em que o governo manda nada ou quase nada e o MST e a Via Campesina, tudo ou quase tudo [...]. As informações acima prestadas permitem concluir que o arrojado plano estratégico do MST, sob orientação de operadores estrangeiros como as FARC, é adotar nesta rica e produtiva região de nosso Estado, o método de controle territorial branco tão lucrativamente adotado pelas FARC na Colômbia13.

Essas informações produziram inquéritos policiais. O Ministério Público deduziu que os membros do MST acampados próximos a Coqueiros tinham por objetivo mudar o Estado de Direito, para isso usaram da força, “incitando a subversão da ordem social”. Segundo o relatório do comando da polícia regional (norte do estado), “constituíram um ‘Estado Paralelo’, com organização e leis próprias, no qual foi negada autoridade aos poderes constituídos da República Federativa do Brasil”14. Em janeiro de 2008, um incidente envolvendo o MST e a polícia marcou o período, relatado da seguinte forma pelo jornal Zero Hora:

Centenas de integrantes do MST invadiram, na manhã desta segunda-feira, a Fazenda Coqueiros, em Coqueiros do Sul, na região do planalto do Rio Grande do Sul. Segundo a Brigada Militar, os manifestantes chegaram em 20 ônibus e três caminhões. Os agricultores exigem a desapropriação da fazenda, considerada estratégica para o movimento (“MST invade Fazenda Coqueiros...”, 2008).

Para evitar maiores confrontos, houve uma grande ação, por parte das diversas polícias, de bloqueios de entrada e saída de gente da fazenda, assim também vistoriados, os ônibus, bloqueadas estradas para que sem-terra não pudessem chegar no local de destino, bem como houve impedimentos de montagem de acampamentos. Fizeram parte dessa operação cerca de 700 policiais, ambos da Polícia Federal, Civil e Brigada Militar (“MST invade Fazenda Coqueiros...”, 2008).

Em outubro de 2007, a governadora Yeda Crusius expediu a Instrução Operacional n. 006 (I0-6), cujo objetivo era criar uma estrutura de vigilância com a intenção de atuar junto às “ações de movimentos sociais em geral em ocupações pontuais de caráter reivindicatório ou de protesto”15. A referida instrução concedeu poderes aos comandantes regionais da Brigada Militar do Rio Grande do Sul para impedir ações de invasões, realizar atos ou protestos em órgãos públicos e áreas privadas, identificar lideranças de movimentos sociais, e ainda, a proibição de utilizar crianças em passeatas, bem como de frequentar determinados lugares, principalmente centros urbanos. A referida Instrução Operacional (IO-6) revelou a intenção da governadora em relação aos movimentos sociais, e deu um cunho político à dimensão policial, criminalizando ações estratégicas do MST. O ato administrativo não foi submetido ao Poder Legislativo. Na realidade, a Brigada Militar já vinha desde o início de 2007 produzindo relatórios sobre os movimentos sociais, em particular, os de cunho agrário por meio de seu serviço de inteligência (a PM2). Nos relatórios, o MST e a Via Campesina, em suas ações, foi apresentada como afrontadora à ordem pública e à ordem constituída, que produziam ações criminosas, taticamente organizadas como se fossem operações “paramilitares”16.

Pareceu-nos que havia facilidade para decretar prisões, pedidos de buscas e apreensões nos acampamentos, confisco de agendas e documentos de acampados, grampos telefônicos ilegais e monitoramento de pessoas. Desta atuação da Brigada Militar, resultou que, entre os anos de 2007 e 2008, houve a identificação criminal como “agitadores da ordem pública” a cerca de 2000 integrantes de movimentos sociais da Via Campesina que participaram de manifestações17. Esses, em razão da legislação em vigor no período, não poderiam ser incluídos em programas oficiais futuros de reforma agrária. Em uma das buscas e apreensões, em janeiro de 2008, foram utilizados cerca de 800 policiais militares, 60 agentes da polícia civil, corpo de bombeiros, helicópteros, agentes da polícia federal, 10 viaturas da polícia rodoviária, cavalaria, cães, e o uso de bombas. O “cumprimento da ordem judicial” desbaratou o Congresso Estadual do MST do RS, onde estavam reunidos mais de 1500 assentados, acampados, prefeitos, deputados, vereadores, professores, intelectuais, no último dia do congresso, quando seriam tomadas as deliberações finais do encontro.

Com base em todas essas ações que criminalizavam os integrantes/lideranças e todo o MST, um procurador de Justiça e integrante do Conselho Superior do Ministério Público, sustentou em reunião deste Conselho, a necessidade de “desmascarar o MST”, por tratar-se, segundo ele, de uma organização criminosa, com nítida inspiração leninista e que se utilizava de táticas de guerrilha rural. Em suas palavras, “cabe ao Ministério Público AGORA quebrar a espinha dorsal do MST. O momento é histórico no país e se constitui no maior desafio já apresentado à Instituição pós 1988: A DEFESA DA DEMOCRACIA”18.

No início de junho de 2008, munidos de informações dos relatórios da Brigada Militar e do Conselho Superior do Ministério Público, promotores das comarcas de Passo Fundo e de Carazinho ingressaram com ações judiciais para a promoção de despejo de acampamentos na Fazenda Coqueiros, inclusive os que estavam montados fora da referida fazenda em terras adquiridas e arrendadas. Liminares foram concedidas e o despejo e desmantelamento efetivados também em várias partes do estado.

Nesse sentido, quando o MST estava se preparando para organizar uma ampla ação no interior da referida fazenda com os contingentes que estavam chegando de outras regiões do estado e que enfrentavam batalhas judiciais para seguir na caminhada até o local, houve uma ação policial de grande repercussão. Em junho de 2008, às 5 h 30 min da manhã, com forte frio, com geada na referida região, em torno de quinhentos homens da BM iniciaram o cerco dos dois acampamentos próximos à Fazenda Coqueiros. Segundo o jornal Zero Hora, os militares “vinham animados, embalados, numa madrugada de prelações do próprio comandante da BM, coronel Mendes e seu sub, o coronel João Carlos Trindade, que, desde segunda-feira, em Passo Fundo, supervisionavam a concentração de tropas para a ação militar” (Belles, 2008b). Os policiais destacados para a missão eram de operações especiais de Passo Fundo, Santa Maria e Porto Alegre, além de unidades de cavalaria e de policiamento ambiental. Continuou o jornal descrevendo: “Ainda era noite quando chegaram perto dos acampamentos [...]. Desligaram os motores dos caminhões e caminharam devagar pelas trilhas. Quando amanheceu, os acampamentos estavam rodeados de militares. [...]. Os policiais estavam preparados para o confronto, com escopetas, escudos e cães de guarda” (Belles, 2008). Não houve confronto. Os sem-terra não resistiram. Acredita-se que tenham sido pegos de surpresa ou por estarem diante de um aparato humano e bélico da polícia, com helicópteros sobrevoando a área, estratégias policiais de amedrontamento e de coibição com dezenas de cachorros adestrados para atacar quem resistisse. Preferiram não entrar em confronto direto, para evitar uma escalada da violência. Um jornal local assim descreve a operação militar:

Era aproximadamente 5h30 da manhã. Antes mesmo de o galo cantar e do primeiro raio de sol atingir os campos encobertos pela geada de mais uma madrugada fria, quando o grande aparato policial chegou aos dois acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), em Coqueiros do Sul. Os sem–terra receberam o mais indigesto bom-dia dos últimos tempos, despertados por tropas militares. Muitos ainda incrédulos ao se deparar diante de suas barracas com policiais fortemente armados e com escudos, cães, cavalaria e helicópteros sobrevoando os acampamentos, ouviram os oficiais de justiça ler em alto e bom tom, aquilo que nem mesmo o mais esperançoso ruralista ou despreocupado sem-terra imaginaria [grifo nosso] (Cornélio, 2008).

Segundo informação da BM, estiveram presentes na operação 716 policiais militares, 13 organizações policiais militares, como, por exemplo, Batalhão de Operações Especiais (BOE) de Santa Maria e Porto Alegre, dos Comandos Regionais de Policiamento Ostensivo (CRPO) das Missões, Fronteira-Noroeste, Vale do Rio Pardo, Planalto, Hospital da BM, do Corpo de Bombeiros e do 4º Regimento de Polícia Montada da capital (Belles, 2008a). O juiz da Comarca de Carazinho concedeu “tutela inibitória” (ordem de proteção/prevenção contra possíveis atos criminosos, fundamentada no histórico de ações ilegais supostamente atribuídas aos sem-terra) para justificar o desmanche dos acampamentos, com o argumento de que os locais serviam de base para práticas de delitos, “sementeiras de conflitos”19. Houve a ordem para que “[...], os acampamentos fossem imediatamente desocupados, requisitando-se, para tanto, força policial e que nos imóveis descritos não se constituam novos acampamentos de integrantes do Movimento Sem Terra, além de retirada compulsória dos instalados no local”20. A retirada de todos os ocupantes foi feita a pedido da Justiça, que considerou não haver justificativas da existência dos acampamentos, ainda que estivessem numa terra arrendada, de propriedade privada, ou seja, num espaço ocupado legalmente. No fundo, foi mais uma das expressões da judicialização da questão agrária promovida por alguns representantes (operadores) da esfera jurídica regional (Vianna, 1999).

Um jornal local justificou a ação da promotoria pública em desmanchar todos os acampamentos dizendo que “[...], numa decisão liminar do juiz Orlando, que tem 76 páginas, temos ciência de que é uma matéria nova, árdua de ser enfrentada. Mas o juiz entendeu que era juridicamente plausível acolher o pedido do Ministério Público de desativação, ainda que as áreas tenham posse e propriedade regulamentadas” (“MST sofre...”, 2009). Discussões e polêmicas em torno desses mandados foram publicizadas, inclusive demonstrando que tais ações eram consideradas por muitos especialistas do campo jurídico inconstitucionais e, que a participação de forças de segurança de instituições não cabia para essas situações.

A partir dessa fase de ocupações intensas na fazenda Coqueiros, o MST passou ser um “inimigo do Estado”, portanto, deveria ser extinto e criminalizado, banido de ações sociais e daí reside a relevância de sua historicização e análise no campo da história agrária brasileira. A ideia central dessa judicialização da parte de alguns promotores, acatada e fortalecida por representantes de comarcas regionais, era “quebrar a espinha dorsal do MST e, isso representa um dos grandes desafios pós-1988 para a democracia” (Tribunal de Justiça do Estado, 2008).

A violência policial sobre os sem terras pode ser caracterizada como terrorismo de Estado. Para Cañón (2018), o Estado, na América, marcado pela dependência econômica do capitalismo norte-americano, legitima as ações contra os atores sociais populares a partir da disseminação da ideologia baseada no anticomunismo, caracterizando os que lutam pela terra como ameaça à democracia e promotores de subversão da ordem.

Sin embargo, para que el capital financiero –cada vez más poderoso, pero sin consenso suficiente– consiguiera la desregulación, la eliminación de las barreras tarifarias, el libre flujo de productos, trabajo y capital; el Estado se convirtió en el ejecutor de una violencia racionalmente dirigida para destruir o cuando menos debilitar a quienes previamente confirió la condición de subversivos, es decir, para descabezar la autonomía de las clases subalternas (Cañón, 2018).

As ações judiciais prosseguiram após esse evento. Oito lideranças do MST e que atuaram na Fazenda Coqueiros foram enquadradas na Lei de Segurança Nacional e passaram a responder processo por crime federal. Segundo informações do jornal Zero Hora, o processo contava, em meados de 2008, com dez volumes, mais de três mil páginas, onde acusava oito integrantes do MST de “terem agido de forma violenta contra o patrimônio e contra pessoas, usando meios ilícitos para impor ao poder público a reforma agrária, incorrendo em crimes previstos na Lei de Segurança Nacional” (Ferreira, 2008).

Algumas denúncias elevaram a atuação do MST ao status de crimes federais, fazendo com que o Ministério Público Federal de Carazinho denunciasse os líderes do Movimento por crimes contra a segurança nacional [...]. A notícia surpreendeu até mesmo a família Guerra, proprietária da fazenda, alvo das invasões, já que denúncias baseadas na lei de crimes contra segurança nacional eram mais frequentes no período dos governos militares (Ferreira, 2008a).

A denúncia para o enquadramento de crime da Lei de Segurança Nacional fundamenta-se nas acusações de que o MST, através de suas lideranças,

[...], constituíram um Estado paralelo, com organização e leis próprias. [...] desprestigiaram o Poder Judiciário e ignoraram a legitimidade da Brigada Militar para fazer cumprir a lei. [..], existência de indícios de que organizações estrangeiras, tais como a Via Campesina e as FARC–Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, estariam apoiando os acampamentos do MST (Ferreira, 2008c).

Inquéritos foram instaurados pelo Ministério Público Federal de Carazinho. O dossiê do coronel Cerutti foi fundamental nesse sentido, desenhando uma espécie de geopolítica de controle do MST em âmbito regional e que essa região seria estratégica para o controle do território nacional, por isso a necessidade de criminalizar e extinguir o MST. Diz um fragmento do referido dossiê colocava que:

Estima-se que a primeira etapa da ação visando obter o pretendido domínio territorial branco seria tentar controlar o território entre as rodovias RS-324 (Passo fundo, Pontão, ronda Alta, Goio-En) e BR-386 (Carazinho, Sarandi e prolongamento por estrada estadual que também conduz à Ponte do Rio Goio-En), estendendo com pontos até a fronteira com o Uruguai o que já lhes daria o controle sobre estas duas importantes rodovias norte-sul, de grande importância estratégica para os fins de controle de área e liberdade de movimentos. [...]. Para execução da primeira parte do arrojado plano estratégico antes referido, é imprescindível a tomada, a qualquer preço, da Fazenda Coqueiros e outras propriedades situadas em seu caminho21.

Logo após as ações de repressão e desmantelamento dos acampamentos no interior e na parte externa da Fazenda Coqueiros, do enquadramento de oito lideranças na Lei de Segurança Nacional, muitas famílias expulsas dos acampamentos foram redistribuídas em outros acampamentos no estado, outras desistiram da luta ou permaneceram auxiliando na conformação de acampamentos que surgiram logo após em outros municípios do norte do estado e mesmo do oeste de Santa Catarina. Um grupo significativo (em torno de 160 famílias) foi assentado em propriedades desapropriadas em algumas regiões do estado numa tentativa de acalmar o movimento. No início de 2009, o MST conseguiu alterar junto à Comarca de Carazinho a deliberação de saída do local do acampamento original (a 30 km da Fazenda Coqueiros) que ainda havia restado à beira da rodovia BR 386, próximo ao município de Carazinho. O acampamento ficou, nos primeiros meses de 2009, bastante reduzido, não mais que 150 famílias. Os oito integrantes do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) denunciados por crimes previstos na Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/1983), em 2014 (seis anos depois da denúncia), foram absolvidos pelo juiz da 1ª Vara Federal de Carazinho (RS). O juiz federal, Stefan Espírito Santo Hartmann, considerou que não havia provas suficientes da prática de atos lesivos à integridade territorial, à soberania nacional ou ao regime representativo e democrático nacional, bem como qualquer ligação do MST local com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), nem mesmo a formação de um Estado paralelo, vinculado em redes com organizações internacionais (“Por falta de...”, 2014).

4. CONCLUSÕES

O conflito pela desapropriação da Fazenda Coqueiros tornou-se paradigmático para a história do MST e da luta agrária no sul do Brasil. Essa luta social foi expressiva das mudanças de estratégias de ação do MST, na não presença de entidades de apoio da Igreja Católica, dos vínculos do referido movimento com agremiações políticas, em particular, com o Partido dos Trabalhadores (PT), da conjuntura política sob a presidência de Lula, dentre outros aspectos.

O MST tentou a via da desapropriação porque a referida fazenda, segundo a entidade, não cumpria uma função social. Esses impedimentos obrigavam aos demandantes da desapropriação ações mais efetivas de confronto, fatos que também produziam resistências de órgãos do estado e do poder judiciário. Tornou-se uma investida sem sucesso do MST em termos de sua demanda num período de fortalecimento dos movimentos sociais, de suas atuações em rede.

Nessa luta social houve uma intensa mediação da esfera política estadual e do poder judiciário através de ações que acabaram judicializando os atos do MST, além de uma intensa criminalização, fatos esses que revelam a luta pela preservação do latifúndio e da não realização da reforma agrária no país. Esse movimento social deixou claro que a reforma agrária nunca foi vista como um tema constitucional em sua dimensão política e social, nem a propriedade da terra além de sua dimensão jurídica, mesmo num governo federal que teve total apoio do movimento.

Os militares protagonizaram a modernização capitalista da agricultura. Essa construção social produzida pelo Estado exigiu a transformação do latifundiário em empresário rural, justificando, dessa forma, a grande propriedade agrícola, agora sob a égide simbólica do moderno. A identidade de empresário rural é estabelecida com a colaboração da Sociedade Rural Brasileira e da Sociedade Nacional de Agricultura. O discurso dessas entidades partia da retórica da “penalização da agricultura”, a qual consistia em afirmar que a agricultura vinha sendo prejudicada com os benefícios estatais fornecidos aos empresários industriais. Portanto, a ação do Estado, na perspectiva da modernização agrícola e na proteção aos latifundiários, convergia ao mesmo ponto: alterar o modelo agrícola sem ruptura estrutural, ou seja, manter o velho modelo fundiário baseado na grande propriedade com uma roupagem nova e considerada moderna (Graziano da Silva, 1982).

Dessa maneira, o regime militar forjou as condições políticas e sociais para a implementação de um novo modelo de agricultura assentado no capital estrangeiro. A agricultura familiar encontrou dificuldades para se manter no contexto econômico baseado na modernização da agricultura brasileira. A agricultura empresarial articulou-se com a indústria e imprimiu um novo padrão produtivo baseado no cultivo intensivo do solo, na utilização de insumos químicos e no emprego de máquinas industrializadas. Diante dessa realidade histórica, mesmo em meio ao governo considerado progressista (presidente Lula), o Estado brasileiro não efetivou a reforma agrária e continuou sensível aos interesses econômicos e sociais das elites agrárias do país.

Como forma de manter a estrutura agrária, evitou-se a desapropriação para fins sociais, pois essa poderia abrir um imenso precedente no agro-brasileiro. Nesse sentido, os sem-terra foram, por meio de dossiês e outras ações do campo jurídico, por operadores do direito, acusados de pertencerem a grupos terroristas, de formarem um Estado paralelo, de promoverem a microcriminalidade no interior da fazenda etc. Algumas das medidas do referido poder causaram polêmicas em nível nacional pelo seu ineditismo, plausibilidade e ideologização como foi o caso do enquadramento de alguns líderes na Lei de Segurança Nacional.

Enfim, a luta social que analisamos de uma forma sintética e panorâmica revela um processo histórico no campo jurídico em relação aos movimentos sociais de luta pela terra no Brasil, da proteção à propriedade privada, em particular, o latifúndio –produtivo ou não–, de novas dinâmicas do MST e dos movimentos sociais em geral em nível nacional. O MST, naquele período, estava fortemente integrado por meio representações políticas institucionais. Não podemos deixar de mencionar também que a luta social pela desapropriação da Fazenda Coqueiros revelou uma intensa organização dos grandes produtores rurais para enfrentar o MST. O conflito agrário, jurídico e militar em questão expressa a continuidade das contradições sociais e políticas em torno do tema da reforma agrária brasileira bem como as constantes resistências de governos amparados por legislações conservadoras, também o reduzido respaldo público dos movimentos sociais no início do século xxi, dentre eles, os promovidos pelo MST.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a contribuição dos revisores anônimos e dos editores da História Agrária no sentido de contribuir o presente artigo.

REFERÊNCIAS

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NOTAS A PIE DE PÁGINA / FOOTNOTES

↩︎ 1. A Via Campesina é uma organização de sujeitos coletivos subalternizados no meio rural e que lutam por reforma agrária, direitos, políticas de desenvolvimento, de cidadania social, etc., em nível internacional. Surgiu a partir de lutas pontuais em vários países da América Latina e se estendeu por várias partes do mundo; atua em rede e produz ações e pressões sociais contra o agronegócio, o latifúndio e o uso de agroquímicos; defende reforma agrária, soberania alimentar, biodiversidade, agroecologia, dentre uma série de outras questões ligadas aos sujeitos, como gênero, quilombos, indígenas, etc. ( Gohn , 2006).

↩︎ 2. O atual município de Coqueiros do Sul desmembrou-se de Carazinho em 1992; em 2008, possuía uma população de aproximadamente três mil habitantes, formada especialmente por descendentes de alemães, lusos, italianos e indígenas. ( Schu , 2009).

↩︎ 3. O Abril Vermelho caracteriza-se por ser um período de maior intensidade de mobilizações do MST em nível nacional em prol da reforma agrária. As ações são várias e buscam relembrar o massacre de camponeses no Pará em 1996, conhecido como o massacre de Eldorado de Carajás, efetivado pela Polícia Militar ( Gohn , 2006).

↩︎ 4. Pela legislação agrária no período, latifúndios comprovadamente produtivos e sem pendengas judiciais não podiam ser alvo de ações por qualquer entidade que objetivasse a sua desapropriação para fins de reforma agrária ( Morissawa , 2001).

↩︎ 5. O estudo é parte de uma ampla pesquisa que estamos fazendo em torno de movimentos sociais de luta pela terra no norte do Rio Grande do Sul, projeto financiado pela Capes, edital n.12/2015, Memórias Brasileiras: Conflitos Sociais .

↩︎ 6. Sobre o tema, ver Silva  (2004) e Fernandes  (2000).

↩︎ 7.

↩︎ 8. Divulgada no dia 28/05/2007, através da Comissão de Cidadania e Direitos Humanos do RS.

↩︎ 9. Não temos espaços aqui para desenvolvê-las; serão objeto de análise de uma produção maior em torno do tema.

↩︎ 10. O Globo , 17 setembro 2007, p. 6.

↩︎ 11. Shirley Prestes, repórter da Agência Brasil, 23 outubro 2007.

↩︎ 12. O espaço não nos permite avançar e nem detalhar, mas nesse ato, várias entidades internacionais, inclusive de direitos humanos, estiveram presentes. A polícia estadual foi intensamente mobilizada, muitas ações judiciais impeditivas do ato dos sem-terra se fizeram presentes. Houve uma ampla judicialização e repercussão midiática.

↩︎ 13. Waldir João Reis Cerutti, “Situação do MST na região norte do estado do RS. Justiça Estadual do Rio Grande do Sul”. Isto dossiê instruiu o inquérito policial federal e cópia do mesmo encontra-se nos autos da ação penal nº 2007.71.18.000178-3, em que 8 membros do MST foram denunciados no crime previsto pela Lei de Segurança Nacional (Lei nº 7170/83) que tramitou na Vara Federal de Carazinho.

↩︎ 14. Idem,  p. 23.

↩︎ 15. Nota de Instrução Operacional n. 006.1/EMBM/2007, Secretaria da Segurança Pública do RS, Brigada Militar, outubro 2007; Poder Judiciário, Justiça Estadual do RS, Processo n. 1.07.0006438-3 (Comarca de Carazinho); Processo n. 1.06.0001436-9 (Comarca de Planalto).

↩︎ 16. Denúncia do Ministério Público Federal no âmbito do inquérito policial nº 2007.71.18.000178-3/RS, anexo 11.

↩︎ 17. Doi-Codi gaúcho, no relatório n. 006- AT-100-PM2-EMBM-03JUN08, fls. 8 e 9.

↩︎ 18. Ata nº 1.116, de 3 de dezembro, de 2007, anexo 2. 9; ata nº 1128, do Conselho Superior do Ministério Público do estado do Rio Grande do Sul, de 7 de abril de 2008, anexo 10.

↩︎ 19. Waldir João Reis Cerutti, “Situação do MST na região norte do estado do RS. Justiça Estadual do Rio Grande do Sul”, Comarca de Carazinho, processo criminal nº 2007.71.18.000178-3, 2007.

↩︎ 20. Orlando Faccini Neto, “Determinação da desocupação de dois acampamentos do MST em Coqueiros do Sul. Justiça Estadual do Rio Grande do Sul”, Comarca de Carazinho, 2008, p. 24.

↩︎ 21. Waldir João Reis Cerutti, “Situação do MST na região norte do estado do RS. Justiça Estadual do Rio Grande do Sul”, Comarca de Carazinho, processo criminal nº 2007.71.18.000178-3, 2007, p. 34. Denúncia do Ministério Público Federal no âmbito do Inquérito Policial nº 2007.71.18.000178-3/RS (anexo 11). Este relatório foi elaborado pelo coronel da Policia Militar Waldir João Reis Cerutti em maio de 2006 e nele são “investigados” vários órgãos, dentre eles, o Incra, a Conab, o MST, o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragens), o MPA (Movimento dos Pequenos Agricultores) e a Via Campesina. O referido dossiê serviu para fundamentar a proposta de desativação dos acampamentos do MST localizados em áreas arrendadas próximo a Fazenda Coqueiros (acatada pelo Ministério 11 Denúncia do Ministério Público Federal no âmbito do Inquérito Policial nº 2007.71.18.000178-3/RS).